Síndrome metabólica – A montanha-russa do açúcar

Vamos então fazer um teste “tipo revista cor-de-rosa”, some o número de pontos (cada tópico vale 1 ponto) que tem, e veja no final o resultado:

– Obesidade, ou pelo menos uma barriguinha que teima em não baixar;

– Diabetes, pré-diabetes, ou mesmo valores da glicémia em jejum que geralmente estão acima dos 85 mg/dL;

– Triglicéridos altos;

– HDL baixo (“bom colesterol” – veja o artigo referente ao colesterol)

– Outros valores do colesterol alterados, mesmo seguindo uma dieta que pensa ser equilibrada;

– Hipertensão controlada por medicação, ou uma tensão que tem tendência para estar sempre mais para o alto, mesmo que o médico não valorize esses valores;

– Sente várias vezes fome ao longo do dia;

– Ainda é novo/a, mas a memória já falha um pouco ou tem dificuldade em concentrar-se;

– Às vezes sente algumas dormências nos pés, mãos, etc., o se tem o Síndrome do Túnel Cárpico ou Neuroma de Morton;

– Faz todos os tipos de dieta, ou tem uma alimentação “equilibrada”, e mesmo assim o ar engorda;

– Já se aproxima dos 50 e começa a ter sintomas de menopausa;

– Alguma doença Autoimune (Artrite Reumatóide, Lúpus, Esclerose Múltipla, Psoríase…);

– Algum sintoma que estava à espera de aqui ver na lista, mas não encontra, esse também serve para continuar a ler!

Se tiver pelo menos um ponto, já poderá sofrer de síndrome metabólica, e quantos mais tiver, mais grave será a situação.

Mas afinal o que é esta Síndrome Metabólica?!

Em 1988 o Dr. Geral Reaven (investigador de longa data sobre Diabetes e Insulinorresistência), durante uma Bating Lecture, palestras organizadas pela American Diabetes Association, apresentou uma investigação sobre um problema emergente que dominou de Síndrome X [1], e mais tarde foi nomeado de Síndrome Metabólica (SM). Reaven descobriu que cada vez mais havia pacientes com resistência à insulina, o que os predispunha a problemas cardíacos. O sedentarismo começou por ser o principal culpado da SM, mas hoje em dia já são considerados vários fatores de risco:

– Resistência à insulina;

– Dietas ricas em açúcar e gorduras (aqui não estou totalmente de acordo, como explicarei mais adiante);

– Falta de rotinas alimentares e poucas horas de sono;

– Fatores genéticos;

– Distúrbios Hormonais;

– Envelhecimento.

São avaliados alguns marcadores para se considerar que um paciente tenha SM, embora por vezes sejam controversos quais os pontos a serem verificados [2]:

– Perímetro da cintura aumentado, conforme os valores nacionais;

– Triglicéridos elevados (≥ 150 mg/dL) ou sob medicação com fibratos, niacina ou a fazer altas doses de ácidos gordos ómega 3;

– HDL baixo (< 40 mg/dL em homens e < 45 mg/dL em mulheres) ou sob medicação com fibratos ou niacina;

– Pressão arterial elevada (pressão sistólica (≥ 130 e/ou diastólica ≥ 85 mm Hg) ou em tratamento com anti-hipertensores;

– Glicémia em jejum elevada (> 100 mg/dL) ou em tratamento com antidiabéticos.

Eu considero que se os valores da glicémia forem superiores a 85 mg/dL já é fator de risco.

A SM é considerada um fator de risco muito elevado para o desenvolvimento de doenças Cardiovasculares. Mas acredito que a influência da SM vá mais além do que é medicamente aceite, e faltam igualmente alguns marcadores para esta avaliação, como a Hemoglobina Glicada e a Proteína C Reativa (PCR), ou até mesmo o marcador mais recente de Proteína C Reativa de alta sensibilidade (PCR-as). A Inflamação Crónica, os défices hormonais (cada vez maiores pela “perseguição” feita ao Colesterol), a má alimentação e a constante agressão pela mesma ao intestino… Tudo isto contribui para a aumento dos casos de SM que em Portugal já se encontra em 27,5% da população [3], mas se se adicionassem os outros valores que falo, essa percentagem disparava para valores muito superiores.

SM-Cupcakes

 

Sobe e desce do açúcar

Na escola todos aprendemos a roda dos alimentos, e que a maior fatia pertence aos cereais (de preferência integrais). Mas serão mesmo assim as reais necessidades que temos?! Os hidratos de carbono (cereais, sendo o trigo o pior, massas, arroz, batata), quando digeridos transformam-se em açúcar, provocando subidas de glicémia repentinas, e quedas igualmente rápidas. O trigo tem um Índice Glicémico (que provoca a subida de glicémia no sangue) dos mais elevados, e comer uma fatia de pão corresponde a ingerir 2 colheres de sopa cheias de açúcar branco! E é indiferente ser pão branco ou integral, é exatamente o mesmo! Se é diabético, considere seriamente se quer continuar a consumir cereais.

A glicémia ao subir em flecha, o pâncreas tem que se esforçar e compensar com uma maior produção de insulina, e em todas as refeições há hidratos de carbono! Cereais de pequeno-almoço com Leite logo de manhã (carregados de açúcar + hidratos de carbono), ao almoço metade do prato tem arroz e/ou batatas fritas, mais umas fatias de pão à entrada, o lanche uma sandes ou uma torrada, e o jantar muitas vezes repete-se os erros do almoço.

O pâncreas fica desgastado com este constante funcionamento, este sobe e desce de glicémia, e, ao longo dos anos deixa de ser eficiente, começando a desenvolver-se a resistência à insulina. É sabido que esta constante agressão pode levar até 40 anos para que instale uma maior incapacidade do pâncreas a dar resposta e que seja declarada a diabetes.

Nas minhas consultas costumo dizer aos meus pacientes que não são os hidratos de carbono que nos dão uma “boa energia”, eles apenas nos dão uma energia instantânea.

Os hidratos de carbono transformam-se em gordura, a proteína transforma-se em músculo, e quando consumimos gordura, esta sim, transforma-se em energia.

O nosso corpo funciona pela “lei do menor esforço”, e se nós estamos constantemente a dar-lhe hidratos de carbono, são esses que ele vai utilizar para funcionar. Como são sempre em grande quantidade, o excesso acumula-se nos adipócitos (as células gordas), principalmente na zona abdominal.

Pegue em qualquer embalagem de um alimento processado, e veja a quantidade total de hidratos de carbono. Divida por 4, e o resultado vai dar-lhe a equivalência ao número de colheres de chá de açúcar. Por exemplo, um produto indica que tem 20g de hidratos de carbono por cada 100g, isto vai dar 5 colheres de chá de açúcar. Mas não se esqueça, se a dose que for consumir for de 200g, duplicamos os valores, e vão dar 10 colheres de chá de açúcar!

E o que é que isto também vais provocar? A glicação das proteínas. Falei de um marcador essencial, a Hemoglobina Glicada (ou Glicosilada), que vai medir a variação da glicémia no organismo nos últimos 3 meses. A glicação acontece quando a glicose se liga à hemoglobina, a proteína que carrega o oxigénio no sangue até às células, deixando este transporte mais deficiente, causando um envelhecimento celular mais rápido.

O excesso de açúcar no sangue acaba por causar alterações sensitivas, e muitas vezes, mesmo sem se ser diabético, começamos por ter dormências nos pés. Muitas vezes os diabéticos têm sérios problemas de sensibilidade nos pés, e frequentemente têm de amputar alguma parte dos membros inferiores. Outras situações de alterações sensitivas são o Neuroma de Morton e o Síndrome do Túnel Cárpico. Os diabéticos têm igualmente um risco 2x superior aos não-diabéticos em desenvolver Alzheimer.

 

Leptina, Grelina, Insulina e a Glicagina

4 Hormonas com grande importância na regulação da fome e níveis de glicémia.

A Leptina é produzida pelos adipócitos (células gordas) e dá-nos uma sensação de saciedade, e a Grelina produzida pelo estômago, dá-nos a sensação de fome.

A Insulina reduz a quantidade de glicose no sangue, enquanto a Glicagina aumenta a glicose no sangue.

Com a má alimentação, à base de alimentos processados, ricos em gorduras trans e hidratos de carbono, a produção destas hormonas está totalmente desregulada.

A Insulina estimula a produção de Leptina, contudo na SM a resistência à Insulina e a diminuição progressiva da produção de Insulina, faz com que este processo fique afetado.

Uma boa forma de voltar a estimular os adipócitos a produzir mais Leptina é através de jejuns, já que esta aumenta após curtos períodos de jejum.

Há várias formas de fazer jejum, mas o que dou maior preferência é o de 24h.

É mais fácil fazer este jejum ao fim de semana, em que se janta no sábado à noite, e só volta a comer no domingo à noite. Nas primeiras 2 ou 3 horas após acordar sente fome pois o estômago produz Grelina, mas como não há comida, o organismo começa a ir buscar a energia acumulada nos adipócitos, estimulando estes a produzir a Leptina. À noite quando volta a comer, o pâncreas volta a produzir Insulina, continuando assim a estimular a produção de Leptina. Durante este jejum devemos beber muita água e infusões (sem serem adoçadas), já que no cérebro o centro que recebe a informação da fome é junto ao centro que percebe a sede, e ao beber líquidos, a fome reduz.

Knife and fork with a glass of water

Quando fazemos regularmente estes jejuns (ou outros tipos), há uma otimização da produção destas hormonas todas, e consegue-se controlar melhor os apetites a aqueles acessos vorazes de comer doces.

Já vimos a variação da Insulina e como mais ou menos ela influencia a fome e células gordas, mas aqui vou voltar a insistir no consumo dos cereais, principalmente do trigo. O Trigo é um dos principais agressores do Intestino (ver o artigo já publicado), causando uma situação que se conhece por Intestino Poroso. O interior do intestino deveria ser íntegro, sem qualquer falha, para permitir apenas a passagem dos nutrientes, vitaminas e minerais para a corrente sanguínea, mas com o Trigo e com os outros alimentos processados, carregados de toxinas e químicos, acaba por ficar com falhas, permitindo que passem agentes patogénicos e alergénios para o organismo. Assim que o nosso sistema imunitário deteta algo estranho, ataca, acabando por produzir igualmente substância inflamatórias, e até mesmo podendo desenvolver doenças Autoimunes.

Daí eu ter indicado que precisamos do marcador da PCR ou da PCR-as, para se saber o grau de inflamação orgânica que temos, que muitas vezes se torna num estado de Inflamação Crónica, produzindo um stress oxidativo constante, levando a um envelhecimento celular acelerado.

Para não me alongar muito mais, já vimos no artigo do Cancro da Mama o malefício do açúcar, além de qualquer outro tipo de cancro, também poder desenvolver-se com mais facilidade e rapidamente com o açúcar e em ambientes orgânicos mais inflamados.

Quanto mais inflamado o organismo, maior será a probabilidade de problemas Cardiovasculares, como por exemplo num estudo que seguiu pacientes com valores de PCR-as alterados, e a necessidade de substituição da válvula aórtica era maior nestes [4].

Cada vez mais se observa que o consumo de gorduras de boa qualidade não influencia nos valores de colesterol, bem pelo contrário. Constato em vários pacientes meus que reduzem o consumo de hidratos de carbono e com o aumento do consumo dessas boas gorduras (cozinhando com azeite virgem ou extra-virgem, óleo de côco, banha de porco) e com a redução das gorduras trans (margarinas), os valores de colesterol e triglicéridos começam a regular. É também fundamental algum tipo de atividade física, nem que sejam caminhadas de curta duração (30 minutos por dia).

Volto a insistir, nós precisamos de colesterol! Do HDL e do LDL, mas sem estar oxidado por má alimentação. O Colesterol é percursor em conjunto com a Vitamina D, de dezenas e dezenas de hormonas, essenciais para a nossa vida. E quanto mais velhos vamos ficando, mais baixa vai sendo a produção hormonal, pelo que precisamos impreterivelmente de ter colesterol e Vitamina D em boas quantidades. Devemos cada vez mais apostar na ingestão de óleos de peixe (Ómega 3 e Óleo de Fígado de Bacalhau), bem como fazer exposições ao sol de forma regrada sem protetores solares, como expliquei no artigo da Vitamina D. Senhoras lembrem-se que após a menopausa o vosso decréscimo hormonal é enorme!

Um tipo de alimentação que sou apologista (e praticante) é da Dieta Paleolítica, ou Paleo, que vai buscar o tipo de alimentação que os nossos antepassados faziam no Paleolítico. Dando preferência à carne, peixe, ovos, legumes e frutas da época, frutos oleaginosos (nozes, amêndoas, etc.) e frutos vermelhos, sem o consumo de cereais, e poucas leguminosas.
Tratem bem do vosso intestino para viverem muitos anos sem qualquer problema de saúde.

Ah, e experimente fazer o jejum. Muito bom para o nosso bem-estar físico e mental.

 

Sejam saudáveis e realizados!

Filipe Rocha

 

[1] http://diabetes.diabetesjournals.org/content/37/12/1595.abstract

[2] http://www.elsevier.pt/pt/revistas/revista-portuguesa-cardiologia-334/artigo/sindrome-metabolica-sua-existencia-e-utilidade-do-diagnostico-90155872

[3] http://www.ncbi.nlm.nih.gov/pubmed/19280993

[4] http://www.ncbi.nlm.nih.gov/pubmed/26911132

 
 
 
 

 
 

 

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